quinta-feira, agosto 25, 2005

No céu da minha cabeça...

Deitei-me. Pesava-me todo o ar que reencontrei desde que cheguei de novo a esta terra.
Na minha cama, o vazio marcava o compasso, mas não chegava para ultrapassar todos os meus pensamentos. De olhos bem abertos, procurava pedaços do que fui... e achei reflexos do que nos aconteceu.
Juntei todas as migalhas caídas e guardei num saco. Queria largar esta vida. Queria parar... e pensar! Bem sei que esquecer o passado é estar condenado a cometer os mesmos erros e por isso, queria absorver tudo e tirar conclusões. Procurava uma forma de me por a salvo. Queria perceber o que fiz de errado, para garantir que a partir de hoje, não seria, apenas e de novo, mais um fragmento.
Depois de muito pensar, julguei ser melhor partir para uma outra cidade... abandonar raízes, deixar tudo para trás e começar do zero...
Aconcheguei-me na cama e tentei matutar essa ideia durante algum tempo... mas logo veio a saudade...
Lembrei-me que o que me faria "fugir", era também o que possivelmente me agarria aqui...
Lembrei o primeiro mês que não falámos e a primeira vez que os seus olhos olharam fundo nos meus. Lembrei da raiva de uma mensagem e do primeiro toque. Lembrei a carta que ficou sem resposta e os primeiros sorrisos!...Lembrei o primeiro beijo... que bateu forte...Lembrei os desejos do meu corpo sem sorte... e senti borboletas no estomago. Aquelas que me perseguem quando o vejo. E precisamente aquelas que se mantém vivas quando ele não está.
...Depois... fechei os olhos. Abracei o meu corpo, na ausencia do seu....e comecei a sonhar...
Tinha arrumado as malas. Iria partir nessa mesma noite. Eram 19.30 quando me abriu a porta de sua casa. Olhei-o, beijei-o e disse-lhe:
-Vou-me embora. Vim despedir-me e dizer-te... que desisto de ti...
Esperei que a porta do elevador se fechasse por trás de mim e chorei frente ao espelho.
Quando o elevador atingiu o nivel do chão da rua, alguem me abriu a porta e sussurrou o meu nome... Limpei os olhos, voltei-me e ergui a cabeça...
- Não vás!- implorou ele- Não posso continuar mais assim... quero ficar contigo!

Acordei!... Tinha o dedo em cima da sua campainha....

sexta-feira, agosto 19, 2005

esperança

Saiu á rua. Uma rua sem nome. Viu a paisagem que conhece de cor...
Um caminho de terra batida onde as folhas repousam. Uma árvore despida, que estica os seus ramos, o mais que pode, para poder dançar, ao som do vento que não vem. Um chão que se abre sempre que ouve o eco da dor das raizes. Um deserto. Uma semente lançada á terra, esperando a chuva que a faça brotar do vazio. Um lago que ainda guarda as últimas gotas de água, abraçando os peixes, as algas, e as plantas...os ultimos resistentes que adormecem quando ele sussurra. Um grilo ainda canta a serenata da noite, chamando o amor...
Uma estação que espera apenas a passagem de um comboio. Um baloiço abandonado pela eternidade do silencio. Uma imagem perdida no escuro. Uma sombra de um corpo. Um adeus que anseia sempre o dia seguinte.
Deitou-se no chão... e mais uma vez, era parte dessa paisagem. Era quem mantinha a recordação contante...era o rosto que chorou toda a agua do rio e mesmo assim, insistia em espreitar pela janela entreaberta daquela casa fantasma.
Os relógios mantinham-se parados. Os ponteiros presos a uma hora que um dia já foi hora. Uma cidade que todos os dias nasce no nada. Uma cidade em que se espera um dia, como quem espera por um comboio que teima em não chegar. Uma cidade deserta, mas mortal e presente como a vida! Não existe tempo. O Tempo, aqui, não trás nada de novo...talvez um dia...
Por isso a cidade chama-se: Esperança...

sexta-feira, agosto 12, 2005

excerto

"Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não na dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água no rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogámos o seu sentido. Nisto eu acredito: na veemência destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos.

E a tua voz ouço-a agora, vinda de longe, como o som do mar imaginado dentro de um búzio. Vejo-te através da espuma quebrada na areia das praias, num mar de Setembro, com cheiro a algas e a iodo. E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas ilusões de que tudo podia ser meu pra sempre. "

Miguel Sousa Tavares
Não te deixarei morrer, David Crockett
p.s: prefiro sempre dar primacia a textos meus...mas este merece um lugar de destaque...podia ter sido eu a escrever isto...

Please, crash into me...

A manhã ainda não se tinha cansado quando a memória fez questão de a acordar para mais um dia.
Abriu os olhos... Era uma estranha. Uma intrusa no seu próprio quarto... repleto de odores que se entranhavam nela...repleto de um cheiro impossivel de agarrar ou esquecer...
Levantou-se. Deixou-se levar pelo deambular dos seus pés descalços, agora feridos pela irregularidade do seu caminhar. Depois parou. Sentia a falta do abraço que nunca pediu, do beijo que nunca roubou, do carinho que nunca exigiu...
Relembrou o dia em que julgou ter percebido porque vivia, em que julgou ter chegado ao seu porto de abrigo... e ter-se encontrado...! Possuia uma crença tão forte... que julgou que não se enganava...
As suas costas deslizaram a parede fria e a sua cabeça encontrou repouso no seu colo. Tocava uma musica repetidamente. Agarrou no telemovel e escreveu algumas palavras, na tentativa de expressar o que lhe ia na alma. Sentia a falta do que nunca disse e dos gestos e dos sorrisos a que se poupou. Sentia a falta do que não viveu... do que podia ter sido...
Releu varias vezes o que tinha escrito... Tied to me tight, tie me up again. Tied up and twisted, The way I'd like to be... For you, for me, come crash into me... e enviou!
As suas mãos tapavam-lhe agora os olhos. Ela desfazia-se num choro compungido. Afinal a distancia não trazia o esquecimento, mas sim a saudade...
Sentia falta do que não deu conta de querer, senão quando não podia mais recuperar. Sentia falta de olhar para ele e ve-lo a devolver-lhe o reflexo da alegria.
...Sem ele, parecia que vivia noutro mundo. Sabia que ele iria sempre omitir a falta que sentiu dela, nas manhãs em que não acordou ao seu lado. Sabia que ele nunca iria falar das saudades que sente, dos tempos que não passou com ela...ou de todos os momentos que não partilharam... e por isso, sentia-se , de novo, fora do seu lugar.
Sabia que a sua semente não iria germinar no jardim dele, se ele não a regasse! Sabia que os seus pés não são capazes de criar raízes, apenas porque ela quer ficar ali... e sabia que tal como no primeiro dia era a crença que lhe ditava os dias e a movia...
Sabia que ele iria ser sempre o seu IDEAL, porém não sabia mais o que era suposto saber...e por isso, esperava e reunia-se de forças para conseguir insurgir...pois acima de tudo, sabia, que por mais que quisesse, a terra, tão cedo, não a iria engolir.

segunda-feira, agosto 01, 2005

o melhor dos meus erros

Naquele dia, passeavam os dois pela praia em silencio. Era final de Agosto. Havia muita gente na cidade, mas áquela hora, a praia estava deserta. Na areia iam ficando as marcas de um casal apaixonado. Nos rostos, o sorriso dos olhos. Na mente, a consciencia do futuro peso daquele dia.
Tão bom, encontrar um espaço para se resguardar- pensava ele, sem lhe dizer nada!
Sempre acreditou que viveria o seu amor em pleno, que um dia soltar-se-ia das amarras e se entregaria por completo. Acreditava que esse dia tinha chegado.
Gostava muito da companhia dela. Sentia-se bem sempre que se olhavam ou falavam. Apetecia-lhe fazer maluquices só para a agradar...só para mostrar que a queria. Ouvia-a mesmo quando ela não falava e prontificava-se a resolver qualquer um dos seus caprichos.
Naquele dia andaram muito. Ela tinha vontade de passear com ele. Não queria deixar de sentir a sua mão a tocar na dela. Há muito que se encontravam e sentiam que tinha de ser dado um passo mais importante. Mas, ela tinha medo de se dar demais, de se perder no que tinha para dar... e então agarrava com força tudo o que recebia.

Naquele dia, passeavam em silencio. Cada um tinha vontade de explodir e de ali mesmo declarar o seu amor...mas olhavam-se e sorriam...sabiam que não precisavam falar...
Ele pensava saber o que fazer, só não sabia como. Ela não sabia nada, mas sentia muito.
Pararam de andar. Sentaram-se junto á agua, deixando que esta lhes molhasse os pés. Ela, mexeu os lábios para dizer qualquer coisa, mas as palavras faltaram-lhe... Ele, sorriu-lhe...fazendo aquelas covinhas que ela adorava. Ela, sentiu-se confiante e disse-lhe :
- Pudesse eu ser o refúgio de um abraço teu, de um toque teu, de uma palavra tua. Pudesse eu ser o cantinho que desejas e aguardas diariamente. Pudesse eu ser o gesto que desejas e te arrepia... e sentir-me-ia feliz...
Ele voltou a olha-la, desta vez... bem fundo dos seus olhos...
- Eu não tenho certezas de nada. Estou a deixar levar-me...- mentia ele.
- Eu também não...só sei que onde estiveres é onde quero estar...onde fores é onde quero ir...
Ele sorriu, reconhecendo aquelas palavras... Depois, olhou-a mais uma vez, pedindo um beijo. Ela beijou-o.
Ele acompanhou-a a casa nesse dia. Ela, pediu que ele ficasse com ela. Ele, beijou-a dizendo que sim. Não conseguiam ficar longe um do outro.
Ele adormeceu primeiro, abraçado a ela.
Ela, olhava-o a dormir. Ouvia-o com carinho a respirar num sono tranquilo e sussurrou-lhe ao ouvido:
- Enquanto sinto o sol a bater na minha cabeça, volto a aninhar-me na tua sombra. E será sempre assim...enquanto quiseres!!
Beijou-lhe a testa e adormeceu... junto a ele...segura!