sexta-feira, agosto 12, 2005

excerto

"Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não na dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água no rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogámos o seu sentido. Nisto eu acredito: na veemência destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos.

E a tua voz ouço-a agora, vinda de longe, como o som do mar imaginado dentro de um búzio. Vejo-te através da espuma quebrada na areia das praias, num mar de Setembro, com cheiro a algas e a iodo. E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas ilusões de que tudo podia ser meu pra sempre. "

Miguel Sousa Tavares
Não te deixarei morrer, David Crockett
p.s: prefiro sempre dar primacia a textos meus...mas este merece um lugar de destaque...podia ter sido eu a escrever isto...

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

... pois podias... ou eu, se tivesse capacidade para isso...

Também eu acredito em tudo isto, acredito que a eternidade das coisas não é absoluta, e que uma coisa para que se torne eterna tem que ser vivida e sentida. Por isso o que para mim é eterno pode não ser para outrém. E de facto há coisas, que por serem eternas rompem a barreira do tempo, como se sempre existissem conosco e para sempre fossem existir.

Gosto (por ser uma forma tranquila de expressar, tão como me sinto agora) da recordação de alguém, que já não se ama, mas cuja perda se aceitou tranquilamente, pois não se perdeu de facto.

"E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente"

"Não perdi nada, apenas ilusões de que tudo podia ser meu pra sempre."

Esta parte nem comento, nem vale a pena, é por demais evidente, e por demais verdadeira.

Excelente!

3:17 da manhã  

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